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Crise na ITV da América Latina

O ano de 2002 não foi um bom ano para os produtores de têxtil e de vestuário na América Latina. Apesar de existirem sinais de recuperação em alguns países, as empresas na Argentina, Colômbia e México necessitam de procurar estratégias alternativas para sobreviverem à eliminação das quotas de comerciais no final de 2004. Estes são alguns dos resultados apresentados pelo relatório sobre as tendências comerciais no mundo relativamente ao comércio e produção de têxteis e de vestuário. O relatório, designado por “World Textile and Apparel Trade and Production Trends”, foi apresentado pelo Textiles Intelligence e apresenta dados que cobrem os EUA, a América Latina, a União Europeia, a Europa Central e de Leste, os estados Bálticos, o CIS (Commonwealth of Independent States), a África Sub-saariana, Este de África, Sudoeste de África e o Sul de África. Na Argentina, a produção e o comércio de têxtil e de vestuário foram abalados pela crise política e económica que o país atravessa. Desde Janeiro de 2002 o país testemunhou o colapso do Produto Interno Bruto (PIB), da produção industrial e do comércio externo, em conjunto com desemprego crescente e pobreza. Durante os primeiros seis meses de 2002, a produção de têxteis desceu 37,7% comparativamente a igual período de 2001, enquanto que o vestuário teve a queda vertiginosa de 44,3%. Apesar das principais vítimas da crise Argentina serem as empresas do país, os seus efeitos sentiram-se noutros países da América Latina, principalmente devido à deterioração do comércio no mercado inter-Mercosul. Esta situação teve um forte impacto nas indústrias têxtil e de vestuário doutros países membros do Mercosur, nomeadamente no Brasil, Paraguai e Uruguai. Face à queda da procura nos países do Mercosur, os produtores de têxteis e de vestuário na Argentina e no Brasil encontraram algum alívio no mercado norte-americano. Em 2002 as importações dos EUA provenientes do Brasil aumentaram em 162% para 319, 4 milhões de metros quadrados. As importações da argentina subiram 362% para 42,4 milhões de metros quadrados. No México, os problemas enfrentados pelos sectores têxtil e do vestuário são diferentes em natureza dos que afectam a Argentina. No entanto, em muitos aspectos são causa de igual alarme. As exportações têxteis e de vestuário caíram pelo segundo ano consecutivo em resultado da redução da procura no mercado norte-americano. A Colômbia registou o nível mais baixo dos últimos três anos em exportações de têxteis e de vestuário, enquanto o país continua a lutar contra anos de disputas civis internas. Basicamente, o México enfrenta uma competição acentuada no segmento mais baixo do mercado norte-americano, devido ao acordo Andean e aos países do CBI (Caribbean Basin Initiative). Tal como o México, estes países possuem quota ilimitada e zero taxas para acesso aos EUA no caso de artigos fabricados com componentes norte-americanos. Os países da Andean e do CBI serão um constante desafio para os fornecedores mexicanos de produtos com menor valor, tais como t-shirts, roupa interior masculina e feminina. O México enfrenta também uma forte concorrência no mercado norte-americano por parte de países asiáticos, em especial da China, sofrendo particularmente com a entrada desta na OMC (Organização Mundial do Comércio) em finais de 2001, o que resultou na remoção da quota de diversos artigos de exportação chineses no início de 2002. A situação ainda não melhorou no decorrer deste ano. De Janeiro a Fevereiro de 2003 as importações dos EUA com origem no México decresceram 9,6% relativamente a igual período de 2002. No entanto, as importações da região Andean e dos países do CBI e da China aumentaram 33,7%, 11,1% e 132% respectivamente. A situação tem tendência a piorar, pois a Argentina, o México e a Colômbia irão enfrentar a competição frontal por parte da China e de outros países asiáticos após a eliminação das quotas no final de 2004. Os produtores de têxtil e de vestuário colombianos esperam que a indústria possa ser revitalizada pela recente legislação que lhes confere acesso preferencial ao mercado norte-americano. Uma das possíveis estratégias para melhorar a perspectiva de sobrevivência da indústria têxtil e de vestuário na América Latina, seria a especialização de cada país em áreas específicas onde possuísse vantagem competitiva. Países com reduzidos custos de trabalho iriam concentrar-se em operações de costura com mão-de-obra intensiva, enquanto países com menores custos de capital iriam concentrar-se em actividades produtivas com capital intensivo, tal como o fabrico de fio e tecidos. Esta situação iria implicar um maior grau de partilha da produção, à semelhança da que é feita entre os EUA, o México e os países das Caraíbas. A especialização e a partilha da produção seriam reforçadas se existisse um acordo negociado de livre comércio entre os EUA e os países da América Central, tais como Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras e a Nicarágua. As negociações para este possível acordo foram lançadas em Janeiro de 2003, estando prevista a conclusão antes do fim do ano. No entanto, o objectivo principal é a muito elogiada FTAA (Free Trade Areas of the Américas), Zona de Livre Comércio da América. As negociações para a FTAA estão agendadas para terminar em 1 de Janeiro de 2005, sendo Dezembro de 2005 o objectivo de fixado para a implementação do acordo. A implementação do FTAA iria possibilitar o ambiente ideal para o desenvolvimento de medidas de partilha da produção. No entanto, os prazos estabelecidos para atingir estes objectivos são ambiciosos, devido a diversos obstáculos existentes. Tudo indica que as possíveis vantagens que adviriam da implementação deste acordo ainda estão a alguns anos de distância. Consequentemente, o México e os países do CBI terão de desenvolver novas estratégias a curto e médio prazo se quiserem aumentarem a quota de mercado nos EUA. Uma possível estratégia para as indústrias no México e nos países do CBI seria começarem a diversificar a sua produção para artigos de vestuário com maior complexidade e valor acrescentado. Mas esta medida teria de ser tomada rapidamente, pois os produtores asiáticos estão a adoptar estratégias semelhantes de forma a preservar ou aumentar as suas parcelas de mercado após a eliminação das quotas no final de 2004. Fica ainda a dúvida sobre a capacidade das indústrias no México e em países do CBI para conseguirem diversificar rapidamente os seus produtos. No curto prazo, o México e o CBI irão continuar a exportar vestuário relativamente simples e de menor valor, tirando partido das suas principais vantagens competitivas: proximidade geográfica, reduzido custo de mão-de-obra e acesso livre de taxas e quotas ao mercado norte-americano. No entanto, ambos poderão enfrentar sérios riscos se os fornecedores da Andean conseguirem aumentar a sua quota de mercado nos EUA para artigos de vestuário com menor valor acrescentado. O Brasil irá continuar a ser competitivo no mercado norte-americano para determinados tecidos, fios e artigos finais. Para além disso, os exportadores brasileiros prevêem maior número de vendas no mercado europeu após o acordo recentemente assinado para o acesso ao mercado têxtil da UE. As exportações brasileiras de têxteis e vestuário aumentaram 50% em Abril e 38% em Maio, relativamente a iguais períodos de 2002, atingindo os 147,42 milhões de euros no mês passado. Infelizmente, o mesmo não pode ser dito da indústria têxtil e de vestuário na Argentina. Pode demorar anos até que o sector recupere do impacto causado pela recente crise.