De saída da presidência da IACDE – International Association of Clothing Designers and Executives, Roland Schuler veio ao Porto entregar o cargo ao italiano Lodovico Zandegù (ver «Não acho que se vá fazer já o funeral à indústria»), mas ainda faz parte do grupo de decisores da associação. Diretor de gestão técnica da IB Company, na Alemanha, o executivo elogiou a evolução da indústria do vestuário em Portugal (ver Crialme atinge a maturidade e P&R Têxteis no “hall of fame” da roupa de desporto) e confirmou que o mundo da moda está a apostar nesta zona do globo.
Qual é o objetivo principal da IACDE neste momento?
A associação foi fundada em 1910 em Nova Iorque, o que significa que temos uma grande história. A ideia da fundação foi criar uma rede de engenheiros técnicos e designers de patentes e que podem, de certa forma, transferir know-how ou resolver problemas na comunidade. E essa ideia vive e queremos tentar levá-la para a frente, porque no nosso negócio aparecem sempre inovações e temos que ter a certeza de que o vestuário que produzimos serve para a sua finalidade e que a qualidade está ao nível desejado pelo cliente.
Ou seja, é um encontro entre as partes artística e técnica.
Sim, exatamente.
Isso ainda faz sentido no século XXI?
Mais do que nunca, porque percebemos que a velocidade está a aumentar e entendemos que temos que ser muito rápidos para trazer os desenvolvimentos para a fábrica. Temos que transferir e receber experiências em termos de digitalização e escolhemos este tópico porque estão disponíveis novos desenvolvimentos e soluções de Tecnologias de Informação (TI), como, por exemplo, as ferramentas de simulação 3D. Precisamos dessa plataforma para efetuar trocas. Temos que nos questionar se já estamos a trabalhar com esses sistemas de TI. Se sim, como é que o fazemos, como é que mudamos os processos, que tipo de pessoas e competências pretendemos. Há um movimento muito grande dentro desta indústria e precisamos dessa plataforma.
Acha que há necessidade para uma mudança de imagem do sector?
Para ser honesto, acho que o vestuário tem uma grande história, que começou na altura em que os seres humanos disseram “quero cobrir o meu corpo” e foi aí que começamos a produzir. Entretanto, a roupa é muito mais do que cobrir o corpo. É um estilo de vida, uma expressão e, entretanto, há um desenvolvimento do vestuário que inclui as marcas de fast fashion e high fashion, que realmente querem oferecer novos produtos dentro de poucas semanas. E isso é muito interessante e desafiante.
É esse o principal desafio para o futuro?
O principal desafio para o futuro é que, atualmente, o vestuário não está em primeiro lugar nas necessidades dos consumidores. Estes querem, como prioridade, um smartphone, depois talvez serviços de design de interiores, mobílias ou algo assim e o vestuário acho que está em quarto lugar. Não é assim tão necessário como no passado. Está mais atrás no ranking de necessidades. Mas temos que ser mais atrativos. Temos que impressionar o consumidor. Temos que fazer produtos bonitos e bons e de uma maneira rápida. E, claro, que sejam acessíveis.
Considera que há uma boa ligação entre as fábricas que produzem e o sector do retalho?
Há uma ligação, mas talvez não uma ligação direta, e o mundo está a ficar mais pequeno. No passado, fazíamos os desenvolvimentos no nosso próprio país e produzíamos localmente. No fundo, o mundo era mais fácil de entender e de gerir. Entretanto, o desenvolvimento do produto passou a ser feito na Europa Central e a produção algures na Ásia. E neste caso temos que ser rápidos e é muito desafiante. Há uma ligação, mas, para ser honesto, estamos a perder muita informação por causa das grandes distâncias e é preciso soluções de TI em que não percamos tempo nem informação.
Quais serão os desafios para esta nova geração de empresas e designers? A Geração Z é bastante diferente da anterior.
A maior alteração passa por perceber como é que gostaríamos de oferecer os nossos bens aos nossos clientes. Ainda vai haver lojas físicas? Como é que estas lojas serão? Que ambiente temos para proporcionar aos consumidores? E o que temos para eles no geral? Há muitas ideias no mercado e acho que o maior desafio é chegar até aos consumidores e impressioná-los.
As lojas hoje já não são bem só lojas, são toda uma experiência. Os retalhistas conhecem estas tendências e saberão capitalizá-las no futuro?
Acho que perceberam o que se passa e que há duas maneiras diferentes de reagir. Uma será ir mais longe. A outra é fazer as mesmas coisas que foram feitas anteriormente e depois acabar por morrer. Para mim, isso quer dizer que o contexto vai mudar completamente, porque os consumidores não querem ir fazer compras, pagar o estacionamento e o saco, não terem espaço nos provadores. E isto são tudo coisas em que temos que pensar e impressionar as pessoas com um ambiente diferente, para as trazer para a loja.
Porque escolheram o Porto para esta convenção?
Primeiro por causa da história, da tradição e da produção de vestuário. Em segundo lugar temos a sensação que Portugal cresce outra vez e agora por causa da tecnologia de vestuário. Estas combinações foram, para nós, a razão para vir a Portugal.
Assistimos a uma mudança das empresas que estavam a produzir na Ásia e no Extremo Oriente há muitos anos e estão agora a produzir em países como Portugal. Acredita que esta tendência vá continuar?
Não assim, a preto e branco. Iremos continuar a produzir na Ásia, mas sobretudo nos fatos clássicos de homem e mulher, que são tradicionalmente feitos à medida e com tecidos europeus.
Produzir na Ásia não é a solução perfeita. Muitas empresas entendem que faz sentido produzir em Portugal e Itália por causa da cadeia de aprovisionamento, mas também da formação e competência das pessoas em relação à tecnologia para vestuário. Talvez custe um pouco mais, mas é mais rápido e o produto é melhor. E em certos produtos a qualidade conta. Fiquei impressionado com a P&R Têxteis, aquilo é verdadeira inovação. Agora já sei porque custa uma t-shirt de ciclismo à volta de 100 euros.