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L de Luxo – Parte 3

Os agentes que marcam a contemporaneidade imprimem uma transformação constante no sector do luxo mundial, cujas premissas essenciais se vão gradualmente adaptando aos interesses de um mercado em mutação.

A singularidade e o reconhecimento do passado permanecem sinónimos do conceito de luxo, que gradualmente passa a integrar novas abordagens, marcadas pela crescente popularidade dos segmentos de viagem e bem-estar, conjugados com uma valorização cada vez maior das experiências privadas (ver L de Luxo – Parte 2).

Tempo

O luxo afasta-se das suas conotações tradicionais, encarnando algo menos tangível, mais abstrato e emocional. Hoje, o luxo significa ter tempo para pensar e espaço para respirar.

No panorama atual, marcado por um ritmo frenético, ansiamos escapar da rotina diária: relaxar, desligar e parar. No futuro, talvez o luxo se traduza em poder parar todos os relógios, com o objetivo de simplesmente relaxar um pouco, sem sentimentos de culpa associados.

Isto é o que o designer e artista Marcin Rusak acredita que será o futuro do luxo. Rusak criou um kit de sobrevivência denominado “Time for Yourself” (Tempo para Si Mesmo, em português), que pretende promover a perda da noção do passar do tempo. O kit contém uma bússola que envia ao utilizador direções aleatórias, um relógio sem mostrador, impedindo a consulta das horas, e um cobertor, que mantém o utilizador protegido. «É quase impossível estar verdadeiramente perdido nos dias de hoje. Seria necessário um grande esforço para experimentar esse luxo», afirma Marcin Rusak.

À media que a vida contemporânea se torna mais caótica, essa necessidade inata de tempo irá intensificar-se. Esta estirpe mais profunda de luxo irá tornar-se cada vez mais desejável, pressupondo uma vivência na qual o tempo é natural e raro e o ritmo quotidiano se relaciona menos com os objetos que possuímos e mais com a forma como os vivemos.

Consciência

A abordagem conscienciosa do ato de compra está a propagar-se. A fast-fashion é considerada, cada vez mais, o desperdício da moda, como algo aborrecido e pouco vistoso. Por oposição, assistimos à expansão do consumo consciente, no âmbito do qual as marcas são honestas e transparentes, divulgando todos os detalhes do ciclo de vida dos seus produtos.

A start-up de moda Everlane vende peças básicas modernas de um modo radicalmente transparente. Esta marca pretende que o consumidor conheça as suas peças de vestuário, as fábricas a que recorre e que se questione sempre sobre o motivo das coisas. De acordo com a Everlane, estas questões não são abordadas abertamente e, por isso, opta por uma total transparência e rastreabilidade dos seus processos.

Jason Kibbey, representante da Coligação de Vestuário Sustentável, concorda e acredita que o futuro da moda passa pela transparência universal, onde os dados estão livremente disponíveis. Desta forma, idealiza códigos de barras carregados com informação sobre cada etapa da cadeia de produção.

A responsabilidade social é um fenómeno de crescente importância. A qualidade torna-se uma questão de quem e como confeciona os produtos. Um subproduto da nossa sociedade descartável, o “Luxo Justo” é agora o novo ideal, pois não perturba a consciência. «É livre de escolher, mas não está livre das consequências das suas escolhas», resume o ativista Ziad K Abdelnour.

Prazer

«O luxo é tudo o que nos faz sentir especiais», afirma Aerin Lauder. «Pode ser um momento, uma caminhada na praia, um beijo do seu filho ou pode ser uma moldura bonita, uma fragrância especial. Eu creio que o luxo não significa necessariamente algo caro».

O luxo é, portanto, uma questão de prazer. Este engloba uma perspetiva na qual o dinheiro não é uma objeção – na qual os banhos de champanhe são a norma e a vida é um simples prazer hedonista. No entanto, o prazer pressupõe também ser capaz de desfrutar do momento: intimamente ligado à noção de tempo, o prazer pode significar aproveitar as coisas simples da vida.

Alison Britton, cujo Tea Cup Set Connoisseur está em exposição no museu londrino V&A – na apresentação “What is Luxury?” – destaca que o prazer pode ser resultado da simplicidade. A sua produção compreende três chávenas brancas, feitas de três formas diferentes, e pretende relembrar como um ritual simples, o beber chá, pode ser um prazer em si mesmo – um deleite pequeno, mas especial.

Dominic Wilcox ilustra também o luxo que pode ser encontrado num passatempo simples, ainda acarinhado. Escolheu um pequena pedra, utilizada para criar ressaltos na água, cobriu-a com folha de ouro e colocou-a numa bolsa de couro sob medida. Através de uma atenção ao detalhe, a rotina pode agora tornar-se algo único e precioso. O luxo não reside apenas no material utilizado, mas na beleza do que a pedra representa: um simples prazer de pura felicidade.

Limitado

Quando algo é limitado, torna-se mais luxuoso. A sensação de escassez, esse sentimento de correr contra o relógio, sempre provocou intriga. E não parece diminuir. Como Morten Grønborg, da Scenario Magazine, diz: «Num momento em que um número crescente de pessoas de classe média pode despender cada vez mais e onde a maioria das sociedades democráticas garantem igual acesso a tudo, a impermanência tornou-se um luxo».

As flores criadas pela ceramista Clara Twomey, previamente expostas na Royal Academy of Art, deterioram-se quando tocadas pelos visitantes. Com o tempo, desaparecem e, assim, a sua beleza reside na sua brevidade.

A designer chinesa Gangjian Cui aborda também o esplendor que resulta da escassez. O seu projeto, The Rise of the Plasticsmith, imagina um futuro onde esgotamos os recursos petrolíferos mundiais. Como tal, a gasolina é um bem raro e desejado, uma vez que já não é massivamente produzido, mas sim de forma artesanal, tornando-se um objeto de luxo.

Deste modo, em virtude da sua brevidade, os objetos transformam-se em algo especial, mais luxuoso, porque desaparecerão antecipadamente.