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Liberalizar com Regras – Parte III

Na âmbito da proximidade da liberalização, 92 associações juntaram-se numa aliança -Gaft- Global Alliance for Fair Textile Trade- para alertar os Governos e a OMC sobre a concorrência desleal por parte da China e, na impossibilidade de adiar a liberalização, promover o debate. O Jornal Têxtil falou com as duas Associações nacionais signatárias da Declaração de Istambul, o documento base desta aliança associativa:

 

Questões

1-;O que é que a Associação pretende com esta proposta? Nesta fase deste processo, não seria preferível garantir uma maior e melhor fiscalização do cumprimento das regras da OMC do que sugerir o adiamento da liberalização?

2-;Dado o prazo de 10 anos para preparar a liberalização definido no Uruguai Round em 1995, porquê este pedido quase no final do mesmo?

3-;Quais são as expectativas do efeito junto dos respectivos Governos, visto que, por ex., o dos EUA já afirmou que vai cumprir o prazo?

4-;A necessidade de consenso na OMC, neste caso, vai dificultar o adiamento?

5-;Como vê o futuro da ITV, nacional e internacional, na hipótese da liberalização, e o respectivo papel da Associação?

 

Nunes de Almeida – ATP

1-No fundo o que nós pretendemos é que se verifique um comércio livre, o que deveria acontecer com este desmantelamento de quotas, mas que seja livre, justo e com as mesmas regras para todos, que é o que não está a acontecer. Assim, em primeiro lugar, pretendemos aproveitar esta ocasião para chamar a atenção para este problema do não cumprimento das regras por parte da China, pois é demasiado grave para não ser discutido, e com a maior brevidade. Esta será efectivamente a melhor altura para o fazer. E pretendemos também alertar para que se tornem mais ágeis e eficazes os instrumentos de combate à não verificação das regras da OMC, como os processosanti-dumping, bem como re-alertar para a possibilidade de utilização das cláusulas de salvaguarda, quando se verificarem os respectivos pressupostos inerentes à sua utilização.

2-O problema surge agora com mais ênfase pois já dispomos de dados estatísticos que não tínhamos, relativamente a artigos pautais que foram envolvidos no último desmantelamento, pelo que estamos mais consciente da gravidade da situação e mais bem fundamentados para demonstrar o desiquilíbrio nas trocas comerciais à escala mundial. Pretendemos chamar a atenção para este problema enquanto vamos a tempo, e nesta reunião penso que se conseguiu isso: a OMC confirmou que iria prestar mais atenção a estas questões.

3-Ainda não sabemos se vai haver força política para avançar com este processo, mas pelo menos temos visto abertura para discutir este problema, quer por parte da OMC, quer por parte do Governo nacional. Reforço a ideia de que o que nós queremos é que este assunto se discuta já, e para que o debate não seja estéril deverá envolver outras associações e países com as mesmas preocupações. Há uma questão que é muito importante que é a futura posição da UE nesta matéria: pode mudar tudo.

4-Sim, vai ser muito difícil, senão mesmo impossível, pois há muitos países com outros grandes interesses na China, servindo mais uma vez o sector têxtil para moeda de troca.

5-No futuro, mesmo que não haja adiamento da liberalização, vamo-nos manter ao lado das empresas e dos empresários e recorreremos a todos os mecanismos que garantam um comércio justo, quer individualmente, quer preferencialmente em associação com outras associações têxteis mundiais. Já houve tempos muito difíceis e os empresários portugueses sempre souberam dar uma resposta afirmativa. Temos oknow how, temos uma fileira com muita experiência, a qual consegue dar uma resposta rápida aos pedidos dos nossos clientes. E temos de promover as parcerias entre os empresários, para garantir uma resposta mais eficaz.

 

José Robalo – FITVEP

1-Pretendemos que o adiamento seja um expediente apenas para dar tempo para discutir e resolver o problema da concorrência desleal por parte da China, porque se fosse apenas para adiar a liberalização pela hegemonia comercial da China, estaríamos na mesma daqui a dois anos. Queremos ganhar tempo para ter um debate sobre este problema, e a conclusão desta reunião de 3 de Agosto vai precisamente ao encontro do que nós queríamos, que é a OMC dizer que vai fazer uma monitorização mais cuidada deste problema. Queremos também que estas negociações não acabem por ser orientadas para um determinado produto específico ou para uma categoria, mas deve haver um tratamento mais lato deste problema. Hoje em dia quando se está a trabalhar um dossier de comércio internacional como este, tem de assegurar em primeiro lugar a garantia da reciprocidade.

2-A China entrou há 3 anos na OMC, mas no início a taxa de penetração nos outros mercados era muito menor do que foi este ultimo ano, e com os dados que temos agora ficámos mais alertados para este problema. A China está a entrar em alguns mercados à taxa de 1% ao mês. Em todos os artigos que já estão livres de quotas, os países produtores perderam no mínimo metade do mercado. Neste momento todas as grandes marcas fabricam na China.

3-É preciso não esquecer as questões estratégicas dos EUA, complementares a esta matéria: o Paquistão, por exemplo, tem grande parte da população perto do limiar da pobreza, que com o desemprego têxtil futuro vai passar fome, e será um terreno mais fértil para os fundamentalistas religiosos actuarem; os EUA têm de equacionar este problema de segurança mundial. E também têm o problema do México, que com um aumento acentuado do desemprego a mão-de-obra excedentária vai-lhes entrar pelo país.

4-Sim, para aprovar este adiamento é preciso que todos estejam de acordo, à excepção do país em questão, e aí vamos ter certamente o problema da falta de unanimidade pois há países com outros interesses na China.

5-Prevemos tempos difíceis com esta concorrência desleal. Temos de sensibilizar o governo português para esta questão com a China, pois estão em causa 200 mil postos de trabalho que se perderão se o têxtil não for considerado prioritário. Em ultimo caso, o governo tem a bomba atómica, que é considerar o sector em crise, se for preciso, e dize-lo aos seus parceiros comunitários. A ajuda aos agricultores tem-lhes sido imprescindível e o têxtil tem sido a moeda de troca. A nossa associação quer para o seu sector e para os seus empresários a liberalização, mas com regras iguais para todos. Não estamos a pedir proteccionismo para a ITV, nacional ou europeia, mas queremos que os outros também não sejam protegidos, e que a regra não seja não ter regra nenhuma.