Durante quatro dias, dezenas de manequins desfilaram pela passerelle mostrando colecções que incluíram desde as tradicionais abayas (longas túnicas pretas) do Golfo e outras vestimentas islâmicas até roupa transparente que revelava praticamente todo o corpo feminino, que constitui normalmente tabu nas monarquias Árabes conservadoras da região. Abou Dhabi é uma capital cultural que tinha também que se interessar pelo mundo da moda», explica Alice Teeuwen, directora desta primeira Semana da Moda de Abou Dhabi, que deverÁ transformar-se em manifestação anual. Este riquíssimo emirado, cujo subsolo guarda 10% das reservas petrolíferas mundiais, investe hoje milhões de dólares em projectos destinados a convertê-lo num bastião regional da cultura e do turismo de gama alta e na capital cultural do mundo Árabe». Os principais projectos incluem a construção de filiais locais de grandes museus como o Louvre e o Guggenheim. A Universidade da Sarbonne abriu também um anexo na capital dos Emirados Árabes Unidos (EAU). Sob um luar convidativo, os jardins do luxuoso Emirates Palace, um hotel todo em mÁrmore que domina o emirado, receberam colecções completamente díspares, desenhadas por criadores Árabes, incluindo do género feminino. Durante muito tempo, recorremos às ideias de outros e compramos as suas colecções. Contudo, dispomos de tudo o que é necessÁrio para criar moda», explica o estilista libanês Rabih Kayrouz, que estudou em Paris e trabalhou para as casas Dior e Chanel. Estou feliz com a mistura que podemos hoje observar em Abou Dhabi e que testemunha o futuro da indústria da moda» A sua compatriota Milia Maroun, a primeira criadora de moda Árabe a apresentar a sua colecção na Semana da Moda de Milão, em Fevereiro último, onde foi elogiada pelos críticos, sublinhou a sua confiança nos criadores Árabes e na sua capacidade para se imporem face à concorrência. Mas outros estilistas apresentaram em Abou Dhabi colecções marcadas pela herança Árabo-islâmica. Aïcha ben Desmal, dos EAU, apresentou uma colecção dominada pelas temÁticas orientais e de inspiração Árabe, nomeadamente nos acessórios. A sua conterrânea de origem afegã, Rabia Z., procurou conciliar a moda e o desejo da mulher muçulmana conservadora mas moderna de vestir roupa em conformidade com as suas convicções. Deste modo, chapéus, por vezes de estilo europeu clÁssico, foram combinados com o hijab (véu) sobre vestimentas que escondiam completamente o corpo. Amina Jassem, estilista saudita, apresentou uma colecção também inspirada pela cultura Árabo-islâmica. Mas as grandes estrelas deste programa digno das 1001 noites foram as criações das casas italianas Missoni e Pucci. O desfile de colecções muito ousadas para a região parece mostrar que Abou Dhabi optou por aceitar as obras dos criadores sem qualquer restrição. Não posso negar ter sentido algum desconforto em determinado momento. Não posso escondê-lo, pois trata-se de uma reacção inerente à minha educação social e religiosa», comenta sobre este tema a estilista do país Layal, especializada em pedras preciosas. Mas, ao mesmo tempo, senti-me muito feliz e orgulhosa, jÁ que mostrÁmos estar à altura de organizar um desfile de moda sem fronteiras em Abou Dhabi. Recuso certas coisas por questões religiosas, mas a moda não tem religião e, por isso, não devemos impor-lhe restrições».