Depois da contratação de novos designers de moda, revisão da oferta online e renovação dos espaços comerciais, a Marks & Spencer (M&S) terá ainda de concluir a implementação de um projeto que definem como ambicioso. Contrariando mais de um século de história no retalho, os grandes armazéns britânicos optam agora por controlar integralmente a sua cadeia de aprovisionamento. O desenvolvimento interno de produtos e sua consequente obtenção rápida e flexível são mudanças radicais para uma retalhista que, desde a sua fundação em 1884, esteve dependente de fornecedores e entidades externas para a produção da maioria das suas peças de vestuário. As parcerias de longa duração estabelecidas com essas empresas, na sua maioria baseadas em solo britânico, orientadas para a produção de grandes encomendas e amplos tempos de aprovisionamento, permitiram à M&S a prática de preços baixos e reputada qualidade dos seus produtos. No entanto, à medida que os principais clientes da retalhista, em particular mulheres com mais de 50 anos, se tornam mais conscientes das tendências de moda emergentes, estes intermediários inibem a M&S de rapidamente atualizar a sua oferta, satisfazendo as necessidades voláteis dos seus consumidores. «Teriam muito a ganhar se conseguissem servir melhor as mulheres mais velhas», afirmou Patsy Perry, docente e especialista em marketing de moda na Universidade de Manchester. «A não ser que tenham os meios para adquirirem peças de design de luxo, é difícil encontrar algo nas lojas, a menos que queiram parecer as próprias filhas». Apesar dos elogios feitos à nova coleção feminina da M&S pela imprensa de moda, os consumidores depararam-se frequentemente com a ausência de tamanhos adequados, entretanto esgotados, e peças adaptadas ao clima britânico. Em contraste, marcas como Zara, H&M e Next, que detêm um maior controlo sobre as suas unidades produtivas, conseguem reabastecer as suas lojas mais rapidamente e disponibilizar uma oferta mais variada e dinâmica de estilos. Aprendendo com os outros Na sequência de um inverno pouco proveitoso, influenciado pela ineficaz distribuição na plataforma de venda digital da marca em pleno período natalício, o CEO da M&S, Marc Bolland, está agora sob pressão acrescida, depois de registar o décimo quarto trimestre consecutivo de declínio no segmento de vestuário da marca. Contudo, os investidores parecem otimistas mediante os resultados preliminares da reformulação da cadeia de aprovisionamento promovida pela retalhista britânica. A margem bruta da empresa aumentou 150 pontos percentuais para 53,7% na primeira metade de 2014, estimulada pelos ganhos de sourcing consequentes das alterações implementadas, ficando ainda assim aquém dos 64% alcançados pela Next e dos 59% registados pela Inditex. As parcerias estabelecidas com alguns dos fornecedores têm já várias décadas de existência e, no caso particular de Dewhirst, remonta inclusive ao momento da fundação da própria M&S. Michael Marks, um dos fundadores, pediu um empréstimo de cinco libras ao grossista Isaac Dewhirst para assim fundar uma cadeia de pequenos bazares na cidade nortenha de Leeds, através do qual conheceu também Tom Spencer, a quem se uniria na criação da icónica marca britânica. Respondendo à tendência dominante das décadas recentes, a M&S estimulou os seus parceiros a transferirem as respetivas unidades produtivas para espaços internacionais, contando atualmente com 78% de merchandising proveniente do continente asiático e apenas 22% de produção em solo europeu, incluindo Turquia, Itália e Reino Unido. «Têm de aprender a gerir a cadeia de aprovisionamento e o envolvimento dos fornecedores na logística da empresa, a gerir as encomendas e o fundo de maneio com muito mais antecedência do que antes», apontou Zen Yaworsky, diretor das operações da cadeia de aprovisionamento da M&S até 2010. Design interno Mark Bolland, em funções desde 2010, pretende ampliar a proporção de produtos concebidos internamente para 60% até 2017, aumentando substancialmente a quota de 25% assinalada no ano anterior. Recentemente, persuadiu o anterior diretor de design de vestuário masculino da Next, Simon Hawksworth, a unir-se à renovada equipa de design da M&S e, no ano passado, contratou dois grandes compradores da Next. O lançamento da primeira coleção posterior à contratação dos diretores de aprovisionamento Neal e Lindsey, reconhecidos pelas funções desempenhadas na Next, deverá ocorrer brevemente e será relativa à temporada primavera/verão que se avizinha. «A coleção primavera/verão foi desenvolvida com muito mais flexibilidade do que no ano anterior», afirmou o CEO. A M&S admite ter feito já progressos substanciais, reduzindo para metade o número de fornecedores de tecidos, de forma a conseguir preços mais competitivos em resultado do volume substancial adquirido nas unidades produtivas de eleição. Uma maior proporção de encomendas será deixada em suspenso e concluída mediante a procura registada. A M&S passará também a lançar novos produtos ao longo de 12 fases distribuídas pelo ano, comparativamente às seis a oito fases que lhe eram habituais, aproximando-se do modelo fast-fashion praticado pela Zara. No entanto, esses passos deverão revelar-se insuficientes para recuperar a posição omnipresente e dominante que em tempos detiveram no Reino Unido.