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Retalhistas conquistam relevância – Parte II

Continuando a análise de Mike Flanagan sobre a crescente relevância assumida pelos retalhistas de vestuário em detrimento das marcas próprias (ver Parte I do estudo), a segunda parte deste estudo foca fundamentalmente as questões relacionadas com as estratégias adoptadas pelas principais empresas de retalho. Diferentes estratégias de subcontratação Se a abordagem da River Island à subcontratação é invulgar, então também o é a abordagem dos fornecedores de vestuário melhor sucedidos. Esta é uma lição que se salienta no recente livro de Suzanne Berger, intitulado «How we compete». Comparando as estratégias de subcontratação dos principais fornecedores de vestuário e componentes electrónicos, Berger conclui que dificilmente duas empresas de vestuário bem sucedidas subcontratam da mesma forma. Mas os retalhistas de vestuário bem sucedidos utilizam efectivamente politicas semelhantes noutras áreas. Raramente despendem muito dinheiro em publicidade por exemplo. Colocam a sua energia na escolha da localização certa para as suas lojas e no design e funcionamento destas lojas, de forma a que as peças de vestuário saiam das prateleiras. Alguns retalhistas colocam muita energia no apoio aos funcionários para aconselharem os clientes e realizarem vendas, outros possuem clientes que são alvo de muitos conselhos e persuasão para comprar e apercebem-se que o que os clientes querem do pessoal da loja é um serviço de checkout eficiente… Nenhuma perspectiva é necessariamente errada, mas o que está sempre correcto é a necessidade fundamental de compreender o cliente. Existem fundamentalmente dois tipos de negócio que funcionam desta maneira. Um é uma bem sucedida cadeia de lojas especializada numa marca própria (abrangendo não apenas o especializados em vestuário como a H&M, a Gap ou a Primark, mas cada vez mais os comerciantes de artigos em massa). A Asda, divisão da Wal-Mart no Reino Unido, é fornecida quase a 100% por marcas e argumenta agora vender mais vestuário do que qualquer outro retalhista no mercado britânico. Efectivamente, a empresa de investigação TNS estima agora que uma extraordinária quota de 27% do mercado de vestuário para crianças passa pelos supermercados. De forma semelhante, a Carrefour reivindica que a sua marca Tex é a principal marca de vestuário em França. A outra principal fórmula de negócio para o sucesso é a da marca gerida como um retalhista. A maior parte das marcas de moda, como Hugo Boss ou Max Mara, funcionam desta forma. Como é óbvio, as casas centradas na moda e no design envolvem-se significativamente com o processo de produção completo, com muitas ainda a possuírem fábricas ou a requererem a exclusividade da produção quando subcontratam. Mas eles não vendem os seus produtos apenas para um retalhista generalista, eles normalmente vendem-nos através de diversos pontos de venda, os quais podem ser detidos directamente, obtidos através de franchising, ou em áreas de concessão em lojas por departamentos. Controlar completamente a experiência do cliente é fundamental para a maior parte destas marcas de moda. Estas não são obviamente as duas únicas fórmulas de sucesso. Lojas de vestuário independentes são importantes na Alemanha e na Itália por exemplo, e são abastecidas principalmente por marcas de moda de gama média. São bem sucedidas fundamentalmente devido à estreita cooperação que existe entre os donos da loja, que compreendem profundamente os seus clientes, e os designers, que ouvem os que estes donos têm para dizer. Marcas de vestuário tipo mercearia Será que existe um papel para as marcas de vestuário do tipo mercearia? Alguns retalhistas adoram-nas, porque através do corte no preço das marcas podem demonstrar a sua competitividade. Esta é a fórmula da TJ Maxx, ou o truque que algumas cadeias de supermercado tentam aplicar de vez em quando, ao tentarem vender Levi’s que importaram do mercado negro. As marcas de vestuário do tipo mercearia são importantes em parte da oferta da Wal-Mart no mercado norte-americano. Mas o desenvolvimento de marcas geridas pela Wal-Mart, como George e Metro 7, vai inevitavelmente diminuir o papel das marcas de terceiros. Simplesmente existem menos espaços na indústria de vestuário onde as marcas do tipo mercearia podem prosperar. Como é óbvio, para as marcas de sportswear como a Nike e a Adidas, o pensamento do tipo mercearia pode ainda funcionar. Uma inovação de produto cuidadosamente investigada pode levar um vestuário de desporto a desempenhar melhor e uma estratégia inteligente de marketing pode espalhar o prestígio desta inovação para outros vestuários da gama. Considerações semelhantes podem ser aplicadas em outros tipos de vestuário funcional, como o vestuário de protecção ou alguns nichos de mercado nos soutiens. Mas, para além do sportswear, as marcas do tipo mercearia estão cada vez mais lá principalmente para os descontos dos principais retalhistas. E este não é um nicho significativamente lucrativo para os seus produtores. Hoje em dia em termos mundiais, são os retalhistas que importam. Tradicionalmente esta não tem sido uma indústria para retalhistas multinacionais, a Wal-Mart, líder mundial representa cerca de 2% das vendas a retalho mundiais, mas a proporção que a Wal-Mart efectivamente compra aos produtores (cerca de 10% do total das compras da Wal-Mart) é reduzida, representando apenas 0,2% das vendas mundiais. Nenhum retalhista de vestuário detém uma quota de mercado superior a 2% em mais do que dois países. As empresas com operações em todo o lado, como a Gucci, possuem tipicamente um conjunto de ramos em áreas comerciais caras onde apenas uma proporção reduzida da população se aproxima. Mudanças em progresso Mas duas importantes mudanças começaram a acontecer recentemente. O ano 2005 foi o primeiro ano em que nenhum retalhista mundial cortou nas suas operações no estrangeiro. Ao longo dos últimos anos, para muitos retalhistas as operações no estrangeiro eram as primeiras a eliminar quando as coisas se tornavam difíceis. A C&A deixou o Reino Unido, a Marks & Spencer abandonou as suas operações em praticamente todas as outras localizações, a Fast Retailing cortou as operações no estrangeiro, a Gap deixou a Alemanha, e as omnipresentes lojas da Benetton, que outrora marcavam presença nos centros comerciais de todo o mundo, desapareceram misteriosamente. Ao longo dos últimos doze meses esta tendência começou a inverter-se. A Gap está agora a dar mais autonomia às suas operações na Europa e está a desenvolver as operações no Sudeste asiático. A Wal-Mart tem assistido ao florescimento da sua marca George através das suas operações internacionais. A C&A está a tornar-se cada vez mais importante para o centro das cidades na anterior Europa de Leste como na Alemanha, seu país de origem, continuando com um bom desempenho na América do Sul. A Next e a H&M estão a expandir-se para o Médio Oriente. A Mango, a Zara e as restantes marcas da Inditex continuam a aparecer em todos os lados. A Fast Retailing referiu que a expansão no estrangeiro é essencial. Os retalhistas norte-americanos, excluindo a Wal-Mart, não se juntaram a esta expansão no estrangeiro de forma tão entusiasmante. Nos EUA, o acontecimento importante tem sido a consolidação no topo, com as fusões Sears/Kmart e Federated/Mays a originarem negócios de vestuário que estão perto de rivalizar com a Wal-Mart em escala. E isto significa que, no restrito clube das principais empresas de vestuário mundiais, já não existe um fornecedor de marca única. Hoje em dia, à medida que os fornecedores de marca estão a ser substituídos por retalhistas em todo o mundo, estão a ser minados de três formas: Possuem menos recursos do que os retalhistas para compreenderem os clientes e as tendências e traduzir esta informação em vestuário para as lojas; Não são tão capazes quanto os retalhistas para focalizar estas tendências; A vantagem que as marcas possuem no negócio de mercearia, nomeadamente o controlo de processos de produção únicos para fornecer características únicas de produto, perderam-se à medida que as marcas começaram a partilhar as instalações com os seus concorrentes. A qualidade única do produto é fundamental em tudo isto, mesmo no mercado da mercearia. Poucas marcas de mercearia eram melhor conhecidas no Reino Unido do que, por exemplo, a marca de batatas fritas Golden Wander. A marca entrou em recessão no início do ano, espremida entre o baixo preço e a agilidade das marcas próprias dos supermercados e a força da marca Walkers detida pela PepsiCo. Espremida também por uma estranha realidade das marcas de mercearia: se não fores a marca líder, provavelmente não terás futuro. Uma realidade que aparentemente não tem aplicação nas lojas de vestuário. A River Island encontra-se na 16.ª posição no mercado britânico de vestuário, onde vai estar dentro de cinco anos ninguém pode prever. Dependendo das suas competências no desenvolvimento de vestuário e conseguindo que estas sejam expostas o mais atractivamente possível, a River Island poderá ser muito maior, muito menor ou mais ou menos igual. Mas tal é tão verdade para empresas com 16% do mercado ou com 0,16% do mercado. No que se refere a sucesso no retalho de vestuário, a dimensão não aparenta ser efectivamente muito importante. Para a marca de vestuário, a dimensão aparenta ser quase predominantemente importante.